Ontem foi um dia fora do habitual (crónica)

Peru a passear na cidade


Bem, na verdade todos os dias são diferentes, porque são únicos.
Mas aquele, pareceu um dia fora do tempo.

Cada dia que chega será sempre uma surpresa e faz lembrar que eu mesmo também sou diferente todos os dias.

Sou diferente do dia anterior.

Mais um cabelo branco, mais uma ruga, mas isso não é o mais importante.

Uns chamam velhice ou a PDI, a p**a da idade, mas eu para além de aceitar o caminho para a velhice, recordo o passado com carinho. Se não souberes, vai ao google e procura por PDI significado.

 A infância e o amor dos meus pais, dos meus avós e dos meus tios. As brincadeiras de rua com os meus vizinhos, os amigos que fui fazendo ao longo da vida, os encontros e desencontros, os desalentos e as aprendizagens. As aprendizagens da vida, algumas feitas à força, outras com ajuda dos amigos e até com a ajuda dos inimigos, permite olhar para o passado com serenidade. 

Não gostaria de voltar a ser criança, mas sim de continuar a recordar com carinho. 


Mas o mais importante é encarar o presente, viver em consciência plena e usar todo o conhecimento, experiência e vivências para aproveitar ao máximo aquilo que a vida tem para nos oferecer. Hoje está um dia de sol radioso, então estou grato por este dia fantástico e vou aproveitar essa dádiva.


Mas dizia, que ontem foi um dia fora do habitual.

Foi mesmo estranho, queres saber porquê?


Durante o dia até correu bem, mas no regresso a casa aconteceram coisas estranhas e imprevistas. 

Foram várias situações que não costumam acontecer.


Depois de fazer o marketing digital, fui passear com o cão. Ele estava agitado, provavelmente porque havia passado o dia inteiro fechado em casa. Quando ficava fechado em casa, o cão sentia-se triste e ficava aninhado a um canto à espera que alguém o levasse à rua.

Quando desliguei o computador depois de publicar mais um anúncio para um cliente, espreitei pela janela e percebi que o céu havia ficado escuro e pesado da cor do chumbo, como se estivesse para cair uma carga de água.

Calcei os sapatos, vesti o casaco e fui buscar a trela do cão. Logo nesse momento o animal percebeu que seria ali o seu ponto alto do dia, uma vez que ia sair a rua com o seu dono.

Até ali, nada de anormal, tirando a agitação exagerada do bicho. Ele saltava, mordia a trela, ia e vinha à espera do grande momento.

Aquilo que para mim era uma rotina, um momento para dedicar atenção ao patudo, uma pausa no trabalho do marketing digital. Aproveitava para fazer um pouco de exercício, enquanto caminhava e por vezes era puxado pelo cão. Mas também aproveitava para oxigenar os miolos e por vezes saía dali uma ideia luminosa. Depois ia a correr para casa antes que a ideia se esfumasse no ar frio e húmido do princípio da noite.


Voltando ao tema que me traz aqui.

Porque é que o meu dia de ontem foi fora do habitual?


Já no caminho de regresso a casa, percorrendo um trajeto diferente, saímos da zona relvada e do campo de jogos e começamos a percorrer o passeio junto à via por onde passavam veículos em ambos os sentidos.


Naquele preciso momento falava ao telefone sobre assuntos importantes de trabalho, que me prendiam totalmente a concentração, limitando-me a puxar a trela do animal e a dar passo após passo.

Num ápice, surge uma sombra na frente dos meus olhos, sem perceber o que se estava a passar. Podia perfeitamente ser uma assombração e naquele instante não tinha como negar.


Queres mesmo saber o que passou pela frente dos meus olhos num final de tarde de sexta-feira?


A luz já estava fraca e era impossível distinguir o que teria passado à frente dos meus olhos.


Bem, vou dar uma pista.


Nunca te aconteceu, sentires um forte esvoaçar à frente do teu rosto? Depois descobres que se trata de um pássaro, de um pombo ou até de uma gaivota esfomeada. 


Bem, naquele caso, tratava-se de uma ave galiforme. Bem, se ainda não descobriste, vou dizer-te que a ave que esvoaçou à frente dos meus olhos enquanto falava pelo telemóvel foi um peru. 

Eu fiquei estupefacto mas tentei levar por diante a conversa pelo telemóvel, como se nada de estranho tivesse acontecido. No entanto, o peru estava ali, à minha frente, no passeio, com os carros mesmo ali ao lado a passarem com alguma velocidade. 

Pensei, enquanto falava ao telemóvel, "alguém vai ficar sem peru para o Natal”. 


O cão puxava avidamente na direção do peru, com vontade de lhe fazer alguma coisa. Segurei-o firmemente enquanto tentava manter uma conversa séria pelo telemóvel.  


Logo a seguir, mais adiante em cima do passeio, a estorvar a minha passagem, estava um carro acidentado contra o portão de uma casa.


Naquele momento, tive que interromper a conversa ao telemóvel sobre o trabalho e necessitei de dizer o que estava a acontecer à minha volta. Uma espécie de pedido de ajuda, um beliscão na pele.


"Peço desculpa por interromper esta conversa importante, mas depois de ver um peru a aterrar à minha frente e logo em seguida ver um carro acidentado em cima do passeio a obstruir a minha caminhada, pergunto-me o que se passa” 


Será isto fantasia?


Provavelmente o carro terá saído da estrada para não atropelar o animal, pensei.

Porque se matar um gato dá azar, o aconteceria se um peru fosse atropelado?


Abanei a cabeça para tentar sacudir as ideias e segui o meu caminho.


Ontem foi mesmo um dia fora do habitual.


12-nov-2022


João Pires autor

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